A convite de uma moça, fui visitar um terreiro de candomblé num bairro perto de umas escolas onde já trabalhei. Qual não foi a minha surpresa quando encontrei muitas crianças que já tinham sido das minhas turmas de escola. Muitas mesmo. Algumas delas eu cuidei quando ainda eram muito pequenas, mas foi muito bonito ver que elas me olhavam sem saber direito se me conheciam ou não, mas depois, de algum jeito, vinham falar comigo, me davam um oi meio tímido e me encaravam. Eu perguntava depois se elas e eles lembravam de mim, algumas diziam que não, outras que sim. Mas as que diziam não me olhavam, me olhavam.
Algumas vinham tocar no meu cabelo, outras perguntavam quem eu conhecia para estar ali.
Fiquei pensando em todas essas crianças e outras mais, nas suas famílias e crenças. Vi todas aquelas meninas de branco dançando na roda e me emocionei. Todas lindas, sorridentes, vivendo suas vidas de criança, correndo, sorrindo, molecas. Uma das crianças que eu me lembrava muito começou a dançar junto comigo e me abraçava, me abraçava. Foi difícil não me emocionar de novo. Fiquei feliz dele menino sem vergonha de no alto de seus oito anos me dar beijo, carinho, dançar comigo, abraço. Ele me perguntava "você vai ficar até o fim? Vai ter um bolo, você vai comer?", e eu enchia o olho de água.
Pensei nas mães e em todas as pessoas da família que eu conheci enquanto estive com elas e como nunca saberia que eram do candomblé. E porque não, porque não andar com sua guia no pescoço se toda pessoa católica anda com seu terço? Pensando até que ponto o preconceito faz com que escondamos nossa fé, nosso jeito de viver a vida, encarar as coisas... e em como isso tudo nos fere. Em como a escola não está preparada para lidar com isso. Em como sabemos muito pouco e por não saber, ignoramos e discriminamos... não sei ainda como resolver isso.
Porque eu também só pude mudar muitas coisas em mim quando me permiti conhecer, encontrar, compreender outras vidas, tentar sentir na mesma frequência, pegar o tom. Aprendi isso com as crianças, elas me deram a certeza e a coragem de lançar-me rumo ao novo sem julgamentos.
O axé hoje veio todo das crianças. Mais uma vez.
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