Você que me lê, me ajuda a nascer.

sábado, abril 29, 2017

Frente a frente.

você me põe de frente comigo mesmo

Ele me disse de um jeito despretensioso, como se não fosse nada, como se pensar assim não fosse algo rebuscado e profundo. Eu agora fico repetindo que ele me disse isso para todo mundo, achei tão forte, eu só pensei que eu queria dar um beijo nele, apertando os lábios, não de língua, só apertar o meu corpo de encontro ao dele, sentir sua pele, seu calor, seu cheiro, respiração. Aquele momento em que a sinfonia acontece. 

Estou apaixonada. 

A late night kiss in Harlem (photo by George S. Zimbel): 1951

quinta-feira, abril 27, 2017

Run to you, senhora Withney Houston.



Que esse não seja o hino das mulheres negras.

Noname.


É possível ser linda e demais de linda por mais de uma vez e sempre?

quarta-feira, abril 26, 2017

segunda-feira, abril 24, 2017

Esperando o caminhão do lixo.

Ele, homem negro. Jovem. 
Fazendo o serviço que muitos e muitas de nós fazemos desde sempre. 
Passa na rua dia sim, dia não.
Usa um óculos escuros, tem sempre um fone de ouvido.

Sobe, desce. Leva o lixo das casas, mas não parece ter perdido a coragem.

Ela, mulher negra. Mais jovem ainda. Na hora que o caminhão passa em sua porta, se posiciona, parece feliz. Ele vem subindo, junto com o caminhão de lixo. Recolhe o que há na rua, acena para algumas pessoas, está de luvas.
É uma cena linda. Eu o vejo, ele subindo. Eu a vejo, ela esperando ele chegar. 

Então acontece. Ele passa em frente a porta dela, ela sorri, chega perto. Ele lhe dá um beijo na boca, com cuidado para não tocá-la. Ela balança o corpo daquele jeito que fazemos quando não conseguimos aguentar a felicidade dentro.

Conversam um pouco e eu que tudo observo, já lavo minha alma com essa dose de alegria de manhã cedo. Mais beijos, mais balanços, ele corre, há que se pegar o lixo e dar-lhe alguma atenção, ele tem cuidado para não tocar-lhe, mas ainda assim não desiste dos beijos. Ela respeita o limite da roupa e da luva, não avança, embora pareça desejar muito. Imagino que aquele balanço intenso é parte do controle que faz para não agarrá-lo.

Um código de corpo que só tem amor.

Ela é jovem e há tanta vida nela que eu remocei alguns anos só de vê-la apaixonada e feliz. Ela é tanto sorriso e balanço que dá para limpar a cidade inteira de desamor e pessimismo. Ele? Ele é quem limpa a cidade da sujeira toda mesmo, ele não é poesia, não, mas, ainda assim, é por ele que o amor se faz 

Toda a rua sabem quando brigam e quando fazem as pazes, ela está lá, ela não está lá, ele não tira os fones, ele não para. Ele e ela me fazem mais corajosa de viver minha própria vida, minhas escolhas. Sem vergonha nem medo.

Sou mais forte vendo o amor ali, esperando o caminhão do lixo. E descobri assim que, ao invés de esperar o caminhão do lixo, o que eu estou esperando agora é ver o amor acontecer, dia sim, dia não, do lado da minha casa. 

sábado, abril 22, 2017

Una.


Tank and the Bangas.


Uma coisa boa leva a outra boa que leva que leva leva 

Cold War, Kiah Victoria.


go, let it go, let it go

Conselhos e café.

No café da manhã, um homem me conta que não dá mais, não dá para continuar a conhecer aquela mulher, há problemas.
Ele me relata o que há, eu digo que não há. Falo que é possível, conto histórias, mostro como com vontade a coisa pode ir, se são esses os problemas que ele e ela têm, a gente resolve, dá pra resolver. 

Eu lembro de mim mesma e penso no que eu gostaria, mas também lhe digo que viver junto sempre tem lá suas coisas, mas é preciso querer. Acho que o difícil é saber se há querer. Mas se há, aqueles dois problemas não serão problemas. 
Ele fica em silêncio. Ele ouve. Ele diz

você tem razão

E suspira. Eu digo para mandar-lhe flores e não desistir. Ele sorri. Faz-se um silêncio, mas é de paz. Vou embora, ele aperta minha mão, tem o rosto sereno, cansado, mas sereno. 

Eu vou embora, falando de outras coisas. Quebrando o silêncio de paz, levando um pouco de amor.

sexta-feira, abril 21, 2017

Sentido.

Eu quero mais, mais do que ele poderia pensar que poderia me dar.
Ele não sabe a medida do que eu quero sentir (nem eu sei, vai saber).
Mas ainda está aqui. E diz querer aprender. 

Não vou ensinar.
Só vou fechar os olhos, respirar fundo e segurar na sua mão. 

Alguém assim.

eu fico feliz quando falo com você porque você é feliz com o que tem, é difícil encontrar alguém assim

Ele disse isso e depois me disse a verdade. Disse que não poderia segurar minha mão e nem estar comigo quando eu quisesse companhia para olhar o mar. Ainda assim, acreditei nele, porque eu sou feliz, mesmo sem ele aqui, mesmo só tendo conhecido ele e sorrido com o fato de ele ser ele, só isso.
 


quarta-feira, abril 19, 2017

A vida é leve.

Chove, eu tenho uma sombrinha e divido com a moça que desce comigo da van.
Há um homem e ele vai conosco conversando, tem o mesmo nome do primeiro menino por quem me apaixonei quando tinha seis anos.
Na viagem, passamos o tempo falando sobre a vida, ele me pergunta o que eu quero, eu digo, ele sorri, ele me agradece por fazê-lo sorrir num dia ruim. Eu digo "todos temos dias ruins" e ele sorri de novo, um sorriso meio amargo, parece lembrar do que não foi bom.
Está cansado, suspira. Me conta do que fez e não fez quando era jovem, ali naquela mesma cidade, que eu ainda estou por conhecer.
E me faz sentir o prazer de falar e ouvir, de saber sobre alguém que eu sei que não vai fazer parte da minha vida, mas foi inteira, enquanto esteve ali.

terça-feira, abril 18, 2017

Pão quente.


O amor pode estar longe, mas é sempre quente.
Quente como pão quente saído de um forno quente numa cidade fria.
Um pão quente que faz muçulmanos e cristãos sentarem-se à mesa e entenderem-se em línguas diferentes.
Mas, não é o pão quente.
É o amor (que também é quente).

Dias melhores já chegaram.

É quando o tempo não passa nem devagar, nem rápido que você imagina ter chegado num momento da sua vida em que você se sente extremamente feliz todo o tempo. O tempo de acordar cedo, fazer tantas coisas e sair para trabalhar, conversar com o vizinho, oferecer um pedaço de bolo.
Voltar em casa, almoçar. Ou ir na casa de alguém almoçar. Depois voltar para o trabalho e dizer para alguém que foi dormir sorrindo lembrando da cara dela.
O tempo passa, nem rápido, nem devagar.
Ele só passa, porque ele é rei, ele sempre passa.
Mas você sabe que você é feliz quando não espera mais sábado ou feriado para acordar cantando uma música que te faz bem.

sexta-feira, abril 14, 2017

quinta-feira, abril 13, 2017

Lost & Found.


Tenho vergonha por você ser quem me fez/ sentir como me sinto

Tudo tão muito e fim

O mais doído é que tantas gentes me machucaram
Tantas gentes me feriram
Tantas coisas me marcaram

E foram os silêncios que me fizeram sentir solidão

Stop where you are.


[Acenda uma fogueira onde você está]

Coisas bunitas, Sara Tavares.


Yolo yolo.


[Donald]

Ciclo.

E depois de sete anos, a imagem volta ao lugar de nunca deveria ter saído.
A imagem que me capturou, que me fez melhor, que me fez mais sorrir do que chorar.
A imagem que me aproximou agora é a que me afasta, que me entristece.

Melhor longe do que mágoa.

E o que era concreto, dissolveu-se na poeira.

Mundo novo.

As pessoas marcam, se marcam. Na história, pela vida. Se deixam levar, levam também. As pessoas nunca são só as pessoas. São coisas, bichos, plantas e lugares. As pessoas não conseguem deixar de ser.
Tem gente doída da vida mesmo, que te encontra e só quer paz. Mas isso não é coisa que se dá assim, que se compra. Demora para entender que dizer não, hoje não, já muda muito. Tem dias que eu não consigo dizer não. Mas tem dias que eu me admiro de gentes sem conseguir.

domingo, abril 09, 2017

É isso.


Trança.

- Você trança cabelo?
- Tranço, vem aqui.
- Quanto é?
(Silêncio) - Não sei, nunca cobrei. É como?


Flor da (cor) da pele.

Ando à flor da pele... não, danço à flor da pele.

Eu fechei a porta. Bati o pé, botei uma pedra. Não vou ficar aqui com nada que me faça mal.

Eu aceito que a gente sempre aprende, que a gente erra, que a gente pode se enganar. Eu aceito desculpas, eu peço, porque eu já sei, nessa idade, que não sei tudo. Eu tenho vergonhas, eu fico sem jeito, eu fico com raiva de coisas estúpidas, eu volto atrás, eu demoro, eu vou rápido. 

Mas, não. Não tudo, não sempre, não de todo mundo, não de quem você ouviu e leu eu te amo. Não, não agora, talvez depois. O que me entristece são os silêncios para sempre. Para sempre é tempo demais. Alguém que não te diz pelo menos não, agora não, eu não posso, está doendo, estou confuso, estou com medo. Eu fico triste de ter amado ou amar alguém que simplesmente some sem dizer nada, como se desse para ler nos silêncios as palavras todas que ela não consegue nem se ouvir dizer. Eu não quero ter más lembranças de gentes que eu amo.

Então, melhor fechar a porta.

Porque ela ficou aberta tempo demais e muita poeira entrou. E cobriu meu coração de terra, tanta terra que daria para enterrar o sentimento. Mas eu não quero enterrar nada. Eu quero continuar ouvindo uma música e sorrir um sorriso bobo, pensando em quando a gente dançou aquela música um dia.

Eu também tenho direitos. Um deles é escolher ser feliz e dizer não.

Que no fim das contas, pode ser um enorme sim.

Não me pegue, não/ me deixe à vontade


Confiança.


sábado, abril 08, 2017

Miudezas.

É quando o coração fica miúdo, moído, que se tem certeza que doeu.

Ele me escreveu, um e-mail com mais de duas frases, contou histórias. Não acreditei. Respondi, fui educada, mas não fingi um flerte, seria mentira.

Minha cabeça, meu coração, não quer passear entre os passados delirantes e felizes e nem pelos mornos e calmos, meu coração só quer bater, sem pensar, só bater. Quero ver, ser vista, amar, ser amada. Simples? Parece que não.

Eu chorei um monte de lágrimas, pelas incompetências todas que me ocorreram. Aquelas que não soube fincar pé e brigar, outras que eu tive preguiça. Mentira, nunca é preguiça, às vezes é só porque eu quero um colo. Chorei voltando para casa, na van. Não procurei esconder, todos viram. Não ligo de amar, de sentir. Ainda que de um jeito miúdo, sem alarde, mas amo. Um amor que espera, que não cobra, só ama. Não sei o que fazer com ele.

Vou dormir, então. 

Descontrário.

U-hu, eu nao quero você como eu quero. 

quinta-feira, abril 06, 2017

Mudança.

A gente se muda e a nossa escrita se muda com a gente.
Outros sons, barulhos, novos vizinhos, outros interesses.

E isso aparece na palavra, no texto, nos poros, na pele.

Sou feliz, assim.

A um passo do estrelato.


Definitivamente, documentário musical é o que eu mais amo na vida (depois de livros escritos por mulheres, crianças e comida).

quarta-feira, abril 05, 2017

Nomes.

Quero uma filha pra chamar de Lúcida.

terça-feira, abril 04, 2017

Eu faço piada.

Eu acho graça, quanto mais as pessoas são pessimistas, eu me animo a acreditar.
Não quero duvidar, quero enlouquecer de gargalhar.

Eu acredito em gargalhadas. 

A cidade e o tempo.


O tempo é um bicho engraçado, fugidio, rasteiro.

Mudar de cidade e aprender os tempos do lugar é sempre um desafio gostoso de viver, dá agonia de saber como vai ser, mas quando acontece, a gente se perde (e também se acha).

Estou vivendo numa avenida de uma pequena cidade. Há o barulho dos carros, das motos. Das motos, das motocas, motocicletas, muitas. Sempre. Tantas.

Há as pessoas passando, aquelas que ficam com seu grito indescritível:


Ó o quiabo novinho, freguesa

Olha a poooooolpa!


E as pessoas que passam conversando alto, tomando parte de quem passa, de quem fica, de quem não voltou. Gesticulam, falam da vida, se espantam, chamam atenção, conversam, sorriem, puxam papo.

O moço me viu duas vezes, na primeira eu queria informação sobre carreto, na segunda perguntou se eu consegui mudar. Contei minha história, descobri que o moço do carreto era seu parente, me convidou pra uma festinha no final de semana. A mãe dele passava e chamou os dois, vem aqui, Miro, traz ela, comi arroz doce quando era quase meio dia. Mas não importa, amo arroz doce, amo casa dos outros, amo conhecer gente nova.

Ela é uma senhora, mas também tem uma moto. Me mostrou a moto, o capacete, riu da minha cara quando eu disse que não sabia guiar nem bicicleta. Disse que ia me ensinar, pra aparecer na pracinha que ela está ensinando a neta aos sábados pela manhã.

Vim embora sem querer vir. Só vim.

Como o tempo.

domingo, abril 02, 2017

Sem ar.

Queria poder abrir o peito, para respirar.
Por vezes tenho sonhos que quando me lembro no outro dia, tenho um mal-estar. Lembro e esqueço novamente mas, quando lembro, sinto como se o sonho, quando sonhei, estava sendo real.

Meu corpo não cabe em mim, preciso respirar.
Não saberia explicar a sensação melhor que isso.
Hoje acordei assim, vi um filme e, mesmo sem caber em mim, mergulhei mais para dentro. Há histórias que nos tocam e fazem a gente olhar pra dentro e para os lados. Às vezes, a gente não encontra ninguém. Para dizer o que somos, o que não somos. Que o amor vai vencer, que não somos perfeitas, mas elas estarão ali.

E a gente tem medo, ou se anestesia da vida, de sentir.

Não sei muito de mim, e descubro que sempre sei menos ainda, quando me sinto assim, sem ar. Penso nas coisas que eu fiz ou não fiz, porque fiz, se faria diferente... e não tenho certeza de nada.

Eu aprendi a falar menos, ouvir mais. Não consigo sempre, mas isso também dói. Falar menos, ouvir mais, também tem dores. Nada te livra dessa coisa chamada (con)viver. Mas é justamente aí, eu não quero que seja um fardo, quero que seja leve, mas não. Vejo que na maioria das vezes em que as pessoas relevam algo que acreditam ter doído nelas, aquilo ali fica, cresce, machuca mais. Não é 'deixa pra lá' e acabou. É 'deixa pra lá', mas ela mesma ainda está sentindo doer, e muito. E aí, quando outra coisa acontece, ela embola as coisas, mistura a zanga de antes com a atual, mistura as frustrações todas, não sara, não passa. Porque ela 'deixou pra lá'.

Uma vez, briguei com um amigo. Eu o amava muito, e nós ficamos sem nos falar. Ele lutou pela nossa amizade, e soube reconhecer que errou. Eu estava machucada, não me enganei. Não deixei pra lá, senti minha raiva, minha zanga. Quando me curei, voltamos a nos falar. Eu sei que ele é uma das pessoas que mais me ama no mundo.

Eu não estou dizendo que eu sou perfeita, não. Eu estou dizendo que gosto de mexer no que está quieto mesmo, porque desconfio que debaixo daquela calmaria toda tem um mar revolto. E esse mar é que não me deixa respirar. Só que esse mar revolto, só dá pra enfrentar junto. Se as pessoas não quiserem lidar com ele, não adianta a gente ir sozinha... e a gente vai, navegando nas águas paradas, com aquele mar revolto por baixo.

Mexer no que está quieto dói pra todo mundo, mas dói menos do que olhar para as pessoas com aquela coisa que você não consegue lidar e vai deixando lá no fundo, debaixo do tapete... e aquilo cresce, dói, eu não quero isso. 

Fences.


sábado, abril 01, 2017

Outro Milton (Nascimento).


legenda: Foto 3x4 de Milton Nascimento com aproximadamente 10 anos.
Rio de Janeiro, RJ, s/d.
personagem: Milton Nascimento
Retrato de Milton Nascimento com aproximadamente 10 anos. Apesar da foto ter sido feita no Rio de Janeiro, o menino Bituca (apelido extraído do nome “Botocudo”, tribo indígena) já residia em Três Pontas, MG, terra de seus pais adotivos.

Ciência-Poesia.



É de manhã e eu lendo ciência-poesia.

Para isso, é fundamental viver a própria existência como algo de unitário e verdadeiro, mas também como um paradoxo: obedecer para subsistir e resistir para poder pensar o futuro. Então a existência é produtora da sua própria pedagogia. (Milton Santos, Por uma outra globalização, Ed. Record, 2007, p. 116)