Você que me lê, me ajuda a nascer.

segunda-feira, fevereiro 28, 2011

Criança.

Aprendam com as crianças. Ela me disse que eu era feia, de um jeito muito sutil:

professora, por que você tá bonita na foto?

Mainha.

Ela virou pra mim e disse

Mas não ache que você estuda pouco porque sai pra ver o mundo – exposições, cinema, teatro, escola de samba, jogar conversa fora – às vezes nesses lugares é que vem a inspiração para escrever melhor, com mais propriedade sobre o que você já conhece

Ela sabe de tudo. Ela consegue, Makota Valdina e bel hooks. Pois eu estava, na exposição do Ródchenko e veio uma ideia super original de escrita. Depois fui ver as fotos de Ricardo Telles e me iluminei. Sou apaixonada pelas fotos de Ricardo há muito tempo, desde o livro Terra de Pretos. Nessa exposição, fotos de alguns países da África que também possuem a língua portuguesa como oficial, me chamou atenção o modo como Ricardo consegue fazer fotos belíssimas sem empanar o brilho da pele preta. Outra coisa que chama muito a atenção, escrita até mesmo pelo curador no texto da exposição, é o modo como olham para a câmera quase todos/as os/as enquadrados/as, sem medo, sem vergonha. Me lembrei do moço que me disse

você olha nos olhos

Como se isso, hoje em dia e aqui, fosse qualidade.

Quem quiser conferir, Pinacoteca de São Paulo, do lado da Estação da Luz. Pra variar, a exposição está no subsolo (porque será, né?).

Gerânio.


Gerânio
Marisa Monte
Composição: Nando Reis, Marisa Monte, Jennifer Gomes

Ela que descobriu o mundo 
E sabe vê-lo do ângulo mais bonito 
Canta e melhora a vida, descobre sensações diferentes 
Sente e vive intensamente 


Aprende e continua aprendiz 

Ensina muito e reboca os maiores amigos 
Faz dança, cozinha, se balança na rede 
E adormece em frente à bela vista 

Despreocupa-se e pensa no essencial 

Dorme e acorda 

Conhece a Índia e o Japão e a dança haitiana 

Fala inglês e canta em inglês 
Escreve diários, pinta lâmpadas, troca pneus 
E lava os cabelos com shampoos diferentes 

Faz amor e anda de bicicleta dentro de casa 
E corre quando quer 
Cozinha tudo, costura, já fez boneco de pano 
E brinco para a orelha, bolsa de couro, namora e é amiga 


Tem computador e rede, rede para dois 
Gosta de eletrodomésticos, toca piano e violão 

Procura o amor e quer ser mãe, tem lençóis e tem irmãs 
Vai ao teatro, mas prefere cinema 


Sabe espantar o tédio 

Cortar cabelo e nadar no mar 
Tédio não passa nem por perto, é infinita, sensível, linda 
Estou com saudades e penso tanto em você 

Despreocupa-se e pensa no essencial 
Dorme e acorda.

domingo, fevereiro 27, 2011

Oxente,

Ontem fui ao último ensaio do bloco carnavalesco Acadêmicos do Tucuruvi (que tem como seu presidente um descendente de árabe!). Esse ano eu torço pra eles por conta do enredo: Oxente – Que seria da gente sem essa gente? Apesar do tema suscitar debates mil e me lembrar um documentário visto num curso sobre cultura afro-brasileira e africana chamado “Abandonem-nos”, retratando o pedido de um intelectual africano que solicitava ao mundo que esquecesse a África, ainda assim acho que vale a pena tomar partido do bloco, que já sofreu represálias via email por conta da escolha do samba.

Se os racistas de plantão acreditam que esse enredo merece vaia, vou com a escola. Alguém tem que remar contra a maré.

sexta-feira, fevereiro 25, 2011

Bessie Smith.

Comecei a ler uma pequena biografia de Bessie Smith (Bessie Smith: Imperatiz do Blues, por Elaine Feinstein. Editora José Olympio, 1989) que ganhei faz muitos anos, junto com um cd seu, de um amigo que não vejo e com quem não falo há muito tempo. A autora diz que nada em sua infância a ajuda a compreender o que significava ser negra e pobre como Bessie foi quando criança. Ela diz que a própria Bessie, se a encontrasse pela rua naquela época, poderia ter antipatizado com sua pele branca, seu rosto comprido e corpo magricela. Mas, diz Elaine Feinstein, ela gostaria de dizer à Bessie que a voz dela tinha dado-lhe coragem.




Apesar de curta e não tão bem escrita, me agrada algumas passagens do livro. Elaine diz:

Para fazer sucesso no mundo do entretenimento da época, as maiores desvantagens de Bessie eram seu porte, a aparência africana de suas feições e o tom negro inteiramente fora de moda de sua pele (p. 21)


Isso me faz pensar em qual tom de pele estaria na moda agora, aqui no Brasil. Elaine ainda diz mais:

A voz do blues urbano antigo é, na maior parte, feminina. Os homens cantavam as grandes canções de trabalho e levavam suas músicas rurais pelas estradas do interior do Sul (p. 17).

Muito mais pelo texto e menos pela biografia, o livro tem algumas passagens interessantes, que nos fazem ter vontade de ler mais sobre a história do blues (na lista, o livro Kind of Blues: tória da obra prima de Miles Davis, Ashley Kahn, Ed. Barracuda, 2007). Lembrei do que vi no documentário Lixo Extraordinário, com Vik Muniz falando sobre uma obra de Basquiat. Numa passagem, ele está em Londres acompanhado de Tião, líder da Associação Comunitária dos Catadores de Recicláveis do Jardim Gramacho. A única coisa que ele soube dizer sobre o artista para o moço foi que Basquiat “dormia na rua”. Ouvindo assim, a gente “esquece” que Basquiat era um negro de classe média, e não um pobretão, como quer pintar (talvez por achar que as histórias de artistas negros só tenham validade quando eles são pobretões, devendo estes esforçarem-se de modo sobrehumano para terem seu trabalho reconhecido) seu Vik. Esse assunto já foi também comentado aqui.

De qualquer modo, ouçam a música de Bessie e sejam felizes. Eu gosto dessa:

There’s nineteen men live in my neighbourhood. There nineteen men live in my neighbourhood. Eigtheen of them are fools, and the one ain’t no doggone good.


Mas não sou tão má. Às vezes, estou pra essa:

Please Help Me Get Him Off My Mind
Bessie Smith

I've cried and worried, all night and I laid and groaned
I've cried and worried, all night and I laid and groaned
I used to weigh two hundred now I'm down to skin and bones
It's all about a man who always kicked and dogged me 'round
It's all about a man who always kicked and dogged me 'round
And when I try to kill him that's when my love for him comes down
I've come to see you gypsy, beggin' on my bended knees
I've come to see you gypsy, beggin' on my bended knees
That man's put something on me, oh take it off of me, please
It starts at my forehead and goes clean down to my toes
It starts at my forehead and goes clean down to my toes
Oh, how I'm sufferin' gypsy, nobody by the good Lord knows
Gypsy, don't hurt him, fix him for me one more time
Oh, don't hurt him gypsy, fix him for me one more time
Just make him love me, but, please mam, take him off my mind.

Ouçam alguma coisa de Bessie aqui embaixo:

 Aqui.

quinta-feira, fevereiro 24, 2011

Eu tiro onda.



Eu tiro onda
Jairzinho Rodrigues

Cheguei ao mundo sem ter nada
Dele não levo nem a sombra
Eu tô aqui pra dar risada
E para tirar onda

Felicidade não se empresta
Não se pechincha e não se compra
Eu tô aqui pra fazer festa
E pra tirar ooonnndddaaa...

Eu tiro onda pra onda não me tirar...
Eu tiro onda pra onda não me afogar...
Eu tiro onda pra onda não me tirar...
Eu tiro onda pra onda não me afogar...

Tenho um aliado lá em cima
Que a minha alma faz ronda
Eu tô aqui pra entrar no clima
E pra tirar onda...

A vida é um grande picadeiro
Na corda bamba eu tô na ponta
Eu tô aqui pra ser o primeiro a tirar onda

Eu tiro onda pra onda não me tirar...
Eu tiro onda pra onda não me afogar...
Eu tiro onda pra onda não me tirar...
Eu tiro onda pra onda não me afogar...

Tenho um aliado lá em cima
Que a minha alma faz ronda
Eu tô aqui pra entrar no clima
E pra tirar muita onda
A vida é um grande picadeiro
Na corda bamba eu tô na ponta
Eu tô aqui pra ser o primeiro a tirar ooonnndddaaa...

Eu tiro onda pra onda não me tirar...
Eu tiro onda pra onda não me afogar...
Eu tiro onda pra onda não me tirar...
Eu tiro onda pra onda não me afogar...
Mais...
Eu tiro onda pra onda não me tirar...
Eu tiro onda pra onda não me afogar...
Eu tiro onda pra onda não me tirar...
Eu tiro onda pra onda não me afogar...
Eeeee...



quarta-feira, fevereiro 23, 2011

Empregada.

Professora, eu vou ser a empregada!

Empregada por que, se você pode ser a dona da casa?

A mocinha ficou sem jeito, voltou pro seu canto toda ressabiada. E veio com essa

Mas a dona da casa faz o quê, mesmo?

Ela olhava para as panelinhas, o fogão, a cozinha montada e não tinha graça nenhuma ser dona de casa ali, naquele contexto.
Entendi tudo.

Ribeira.

Do outro lado de minha morada, Ribeira.

segunda-feira, fevereiro 21, 2011

Amizades.

Incertezas.
Depois de escrever em blog quase seis anos, agora acho esnobe ficar comentando dos livros que leio, dos filmes que vejo. Acho que ninguém quer ler, quer ouvir ou comentar. Vai entender. Devo estar chata de mim mesma.

domingo, fevereiro 20, 2011

Arisca, ainda.

Ultimamente eu tenho descoberto mais de mim do que eu quero descobrir. Um amigo me disse o quanto eu me preocupo em fazer tudo certo e como isso enche o saco às vezes. Ou sempre, mas ele é amigo e aliviou um pouco. Não entendo, mas também não quero ser outra pessoa.
Só me divirto com as descobertas. Dia desses, li umas coisas que escrevi uns dois anos atrás, sobre quem eu era, o que eu pensava sobre mim... é tudo aquilo que ainda penso de mim hoje, eu ria e lia e lia, tudo que ali estava era ainda o que eu penso de mim! Eu sou mesmo uma rabugenta incurável, daquelas que dificilmente muda de opinião. Mais uma vez, não é que eu não gosto disso, só acho estranho descobrir o quanto isso é também verdade para outras pessoas.
E sabe o que é mais engraçado? Quando você se enrosca com outro arisco. Isso eu ainda não sei como fazer direito. Mas talvez me ajude a olhar um pouco pra mim pra descobrir coisas sobre ele. Sobre seus medos, fugas e reclames. Ausências e presenças.
Ogum e suas quizilas.

sexta-feira, fevereiro 18, 2011

Mudanças.

Eu tenho muitas coisas para escrever. Mas agora, sem internet, fica difícil. Porque às vezes eu estou longe de uma conexão e a vontade de escrever passa, mesmo que não tenham passado as sensações do que vivi e quero escrever.
Acontecem muitas coisas no meu dia, todos os dias. Na verdade, não consigo nunca ter uma rotina. Estou sempre atolada de coisas para fazer, de livros para ler, filmes para ver, pessoas para falar. Nunca dou conta e vou dormir feliz com isso também, com a possibilidade de começar de novo e sempre, sempre sabendo que não vai dar tempo e tudo bem por isso.
Estava ouvindo Makota Valdina falar num vídeo (Mojubá, A cor da Cultura), e depois fico pensando em como a gente pode continuar fazendo as coisas junto, com aquela paradinha no meio para fazer as nossas coisas. Tentando juntar bel hooks e Makota Valdina, mulheres pretas que aos seus modos estão tentando fazer nossas vidas de hoje serem melhores que as de antes.
Mudei de escola, agora vou e volto andando do trabalho pra casa, encontro gentes na rua, é a vida que eu quero viver, assim, simples, sem muita coisa, mas com tudo que eu gosto, aconchego, carinho, compartilhando coisas e sorrisos, ando feliz.
Adoro mandar mensagens no celular pra alguém quando vou dormir. Melhor ainda é receber, quando ainda não mandei. Feliz de quem tem alguém sempre pra fazer isso, homem ou mulher, namorado ou amigo. Não importa muito. É mandar que faz um bem, antes de dormir, aquela horinha do pensamento, como dizia minha vó. Nem sempre eu tenho dinheiro pra mandar mensagens, mas fico feliz de ter sempre alguém esperando.

quarta-feira, fevereiro 16, 2011

Criança.

A mocinha virou pra mim e disse

Mas você já foi criança?

E a outra respondeu, apontando pra mim

Mas claro. E um dia eu vou ser igual à ela, professora

sábado, fevereiro 12, 2011

O meu corpo? O que ele diz?
Diz trejeitos
Diz requebros
Diz palavras embaladas
Canta pontos
Saúda meus santos e santas
O meu corpo?
É desenhado
Geografado de sonhos e suspiros
De dores e gemidos
Dissabores
O meu corpo?
Nele eu me enrosco
Dentro dele acalanto
Me encontro de encanto
Me encanto no recanto
Reconto
O meu corpo?
É meu
E quem mais eu quiser (só quem eu quiser!)
E quando
Porque é só nele que eu acredito.
Meu corpo, meu pedaço de vida.

Versinhos escrevinhados ao som das palavras de professor Munanga, numa dessas aulas, dia 20 de setembro de 2010.

terça-feira, fevereiro 08, 2011

"With" my hair.

Eu assisto muito pouco a TV'. Até deveria ver mais, mas não tenho costume, paciência ou sei lá o quê. Mas, normalmente, quando assisto, acabo vendo sempre alguma coisa deveras interessante.
Esse clipe aqui:




Eu achei fantástico. Lembrei que a mocinha é filha do Will Smith e lembrei do Chris Rock e o documentário que o moço fez por conta de uma pergunta de sua filha acerca de seu cabelo, documentário esse fácil de encontrar aí pela internet. Chama-se Good Hair. Dizem que tem a legenda por aí também, mas eu não vi direito, procurem, procurem, vale a pena.

Quer saber o que ela diz? Aqui, cheia de marra.
Por enquanto é só. Mas vejam o clipe.

sábado, fevereiro 05, 2011

Mulheres das águas.

"Na realidade, os critérios de beleza tem muito a ver com a dinâmica da cultura. A mulher de seios fartos, de curvas acentuadas, imagem que se associa a Iemanjá, perde lugar não só nas expressões afro-brasileiras, mas sobretudo na sociedade abrangente em que a juventude é uma das qualidades mais valorizadas pelos seus membros. A beleza, portanto, perde seu tom austero e ganha um tom dinâmico, jovial. Ser esbelto, esguio, é o objetivo de todos os estratos sociais".
Terezinha Bernardo, em As mulheres das águas, no livro Ciências Sociais na Atualidade, Cortez Editora, 2004.

Estado Bruto.

Felicidade só presta quando é muita.
Isso é que eu sinto quando estou com gente boa.
Amigas e amigos.
E mais não falo, que sou discreta.