Você que me lê, me ajuda a nascer.

quarta-feira, abril 29, 2015

Samba.


Amada.

Toni Morisson

Acabei de ler Amada (Pulitzer de 1988) de Toni Morisson, autora que que ganhou o prêmio Nobel de Literatura em 1993, ano em que eu tinha 13 anos e ia conhecer ainda Geni Guimarães com A Cor da Ternura, livro que já comentei aqui. Demorei muitos meses para terminar, porque era difícil continuar um livro que conta a história de Sethe, uma moça escravizada que, num ato desesperado, tentar assassinar uma de suas crias na tentativa de protegê-la do horror que ela esteve submetida por anos. Amada é o nome da moça, que depois de muito tempo aparece novamente, voltando para casa e para a vida de Sethe e de sua outra filha, Denver.



Mas a história não é só isso e não pode ser resumida nessas poucas palavras. Morisson tem tudo que é possível ter de beleza numa escrita sobre sofrimento, sobre nossa história, sobre dor. Ela consegue me fazer chorar sem deixar a lágrima cair, ela consegue me curar as feridas de uma alma ancestral, ela é parte do que eu me sinto agora, do que eu sou hoje. 

Capa do livro Amada, tradução de Massaro, publicado pela Ed. Nova Cultural, 1987*

Enquanto lia, tentei separar algumas partes para transcrever aqui, mas não conseguia levantar para buscar um lápis ou simplesmente lembrar-me de fazer qualquer marca, eu apenas lia e lia, arrebatada. Lia, depois passava dias longe do livro, olhando ele ali de lado deitado na cabeceira da cama. Eu pensava em Sethe, em Denver, em Amada e em Paul D., e em como o fim do livro parece com a minha história hoje. Como Toni Morisson consegue isso? Eu me pergunto. Eu só posso pensar que ela cava bem fundo dentro dela mesma e encontra todas nós, mulheres negras, dentro de seu útero, pronta para serem nascidas. 

Copio uma parte do livro bastante divulgada na internet, o sermão de Baby Suggs, sogra de Sethe:

“Aqui”, ela disse, “nesse lugar mesmo, somos carne; carne que chora, gargalha; carne que dança descalça na grama. Amem isso. Amem isso com força. Porque lá eles não amam sua carne. Eles desprezam ela. Eles não amam seus olhos; eles arrancariam eles assim que pudessem. Amam menos ainda a pele de suas costas. Lá eles esfolam vocês. E oh, gente minha, eles não amam suas mãos. Essas eles só usam, amarram, acorrentam, decepam e largam vazias. Amem suas mãos! Ame elas. Levantem elas e beijem elas. Toquem outras pessoas com elas, batam palmas com elas, esfreguem elas no rosto, porque eles também não amam elas não. Vocês têm que amá-las, vocês! E não pensem que eles adoram a boca de vocês. Eles, lá fora, eles vão vê-la quebrada e vão quebrá-la de novo. O que você fala com ela eles não vão prestar atenção. O que você grita com ela eles não vão ouvir. O que você coloca nela para nutrir seu corpo, eles vão arrancar e te dar as sobras no lugar. Não, eles não amam sua boca. Vocês têm que amá-la. É da carne que estou falando aqui. Carne que precisa ser amada. Carne que precisa descansar e dançar; costas que precisam de apoio; ombros que precisam de braços, braços fortes é o que eu digo. E oh, gente minha, lá fora, me escutem, eles não amam seu pescoço livre e ereto. Então amem seu pescoço; ponham uma mão nele, façam carinho e toquem ele e o mantenham firme. E todas as suas vísceras, que eles iam usar como lavagem pra porcos se pudessem, vocês têm que amá-las. O fígado escuro, escuro – ame ele, ame ele, e o coração cansado e pulsante, amem ele também. Mais que os olhos ou os pés. Mais que os pulmões que ainda vão sorver ar livre. Mais que seu útero segurador de vida e as partes íntimas que plantam vida, me escutem agora, amem seu coração.” (p. 87)

Em 1998, há o lançamento do filme Bem Amada, que vi antes do livro e é inspirado nele. Recomendo também!


Encontrei um estudo sobre o sermão aqui.

*Há uma outra publicação em 2007, pela Companhia das Letras. 




terça-feira, abril 28, 2015

Seu Jura.

O senhorzinho sorria com uma cara descarada jogando uma partida de xadrez e lamentando sua má sorte. Mas era tudo mentira. Ele jogava bem, mas fingia que era um fracasso no xadrez. Fazendo assim, levou as duas partidas.
Seu Jura, moço aposentado que leva a vida ensinando xadrez. 

Não olhe pra trás.



Astigmatismo.

Ele olha bem dentro dos meus olhos e diz

você tem astigmatismo

E eu suspiro boba, mas ele explica sobre a luz e as piscadelas que eu dou quando o sol tá indo embora.
Mas é a profissão dele, a luz, a fotografia, ele sabe tudo.
Mas ainda assim eu suspiro boba, prefiro fingir que é paixão e que ele sabe tudo de mim.

Talvez não saiba, mas continua me olhando, mesmo depois que a luz do sol vai embora e somos só nós e a lagoa. Talvez não saiba, mas ainda assim, eu gosto.


segunda-feira, abril 27, 2015

sábado, abril 18, 2015

Pacto.

Vamos fazer assim, vamos ficar juntos.
Mas de longe, contando nossas histórias.
Sem perder o controle.
Não fala meu nome três vezes, não me pede calma.
Faz silêncio depois de uma frase de efeito, me diz outra.

Vamos fazer assim, não falar de desejo e sentimento.
E vamos ajudar um ao outro a continuar a nossa vidinha que não escolhemos direito.
Não me pergunta se eu te quero, eu não vou fazer o mesmo.

Com a certeza de que nunca faremos nada para nos machucar, seremos felizes então.


Precipício.

Eu, medo (mas)
Me jogo, pulo alto.
Aposto, não acerto. 
Vejo o erro e corro por ele, pra ele, deixo ele acontecer.
Sou humana feita com a mesma carne daquelas pessoas que erram.
Com medo, mas também pelo medo, vou ao encontro dele.

Feita de pó, lama, barro e espírito bruto
Estou errada, errante, sou medrosa
(mas) vou em frente.
Digo que não posso (é mentira)
Finjo que não (é mentira)
Roo unha, coço o indicador com a ponta da língua (é sim de verdade) 
E penso nele
E em mim, nós dois.

Mas deixo pra depois
Me ocupo de coisas desimportantes (que às vezes tem ele também)
Ele, o erro. 
Ele, o homem. 
Ele, o precipício

E me lanço, voo alto, incerto.
Daqui de cima, um infinito de possibilidades.


quinta-feira, abril 16, 2015

Amor demais.

Foi tão automático que ele me perguntou onde eu estava que ele nem sequer percebeu direito que parecia quase gafe ele querer saber de mim mesmo sem ser "o" homem.
Fingi que não foi uma falta grave e disse, não tinha o que esconder. Fui ali ver o por-do-sol, só isso.
Mas ele me deu tchau, não podia mais falar ao telefone. Estava ocupado.

Eu, despreocupada.

domingo, abril 12, 2015

Desejo.

A gente conversa por horas. 
E lá pelas tantas o sinal some o celular descarrega o bônus não entra a moda não pega.
Aí a gente desconecta.
É assim.
Falamos por horas, mas o que eu sinto por ele tem seis letras. 
As mesmas do título desse post vagabundo.

sexta-feira, abril 10, 2015

A praia.

A voz dele me lembra o mar.
O cheiro do mar, quando as ondas batem nas pedras, o mar.

Sempre é o tempo que me dá rasteira e me mostra que eu ainda posso me surpreender com aquilo que sinto. Com o que me fazem sentir. Ele melhorou, eu também, vai saber. 

quinta-feira, abril 09, 2015

quarta-feira, abril 08, 2015

Novembro Negro GENERA (FEA-USP).


Veja o vídeo aqui:
Duração total: 1:34:09
Adicionado em: 06.04.2015
O que é ser negro no ensino superior: impressões, construção, incentivos e limitações Grupo de discussões apresentando percepções de alunos, funcionários e professores negros em instituições de ensino superior
Coordenação: Profa. Sandra Maria Cerqueira da Silva Mattos e Profa. Dra. Silvia Casa Nova
Participações: Angela Lucas , Carolina de Carvalho, Gabriel Milanez, Joana Nunes, Marcus Silva, Mighian Danae, Nilson de Oliveira, Thatiane Gomes, Sandra Mattos
Categorias: Qualidade de Vida, Políticas Sociais, Educação, Cultura, Administração Geral

domingo, abril 05, 2015

Coisa feita.

Ele sai do trabalho, ele me liga, ele não me esquece.
Mas nunca dá tempo e ele some, ele aparece.
Diz que me procurou, mas no ecrã não tem o nome dele.
Apago do celular, desativo aplicativos.
Mas é uma doença, sarna, encarna.
Na pele, pensamento, bocas e queixas.

Ele vem pro trabalho, eu o espero.
Eu o vejo passar.
No intervalo, no meio da tarde, ele come um sanduíche que está dentro de uma marmita.
Quem fez eu não sei, ele jura ser a mãe, eu temo ser a ex.
Eu temo, mas não digo nada.
Fico ali do lado enquanto ele mastiga calado, olhando a praia do outro lado.

Aponta pra uma pedra, meio do mar e diz.
Eu queria a gente ali agora.
Eu penso na vida real e digo.
A maré tá alta, você não chegaria a tempo de bater o ponto.
Ele abaixa a cabeça, o último pedaço do sanduíche cai no chão, ele amassa com o pé, tampa o vasilhame.
Fica de costas, o tchau sai abafado.
Volto para o ponto de ônibus sem me despedir.

À noite, ele liga, ele não desliga, ele reconhece, pede desculpas.
Mas não é nada, é só a vida que nos atropela, todos dias.
Nós e os nossos sentimentos. 

Dor.

Não há remédio, nem aqueles que dizem que tiram a dor com a mão.
Não há remédio para uma mentira mal-contada, para desprezo, para silêncios, vergonhas e medos.

Essas coisas sempre vão fazer doer. E muito.

sexta-feira, abril 03, 2015

A coisa à volta do teu pescoço.




Numa das últimas viagens, comprei o livro A coisa à volta do teu pescoço. Achei que a tradução para o português de Portugal deu mais beleza à narrativa de Chimamanda, muito embora eu possa apenas estar de nariz torcido para a tradução da Companhia das Letras, que não publicou ainda esse livro, mas que na minha opinião, faz todos os outros livros dela parecerem iguais (essa é uma birra antiga, quando eu ainda nem tinha lido Chimamanda e sim a história de Henrietta Lacks). 
Este é um livro de contos que gira em torno de histórias de doze mulheres.
Divididas entre dois continentes - África e América -, estas mulheres lutam por um lugar e uma identidade no mundo moderno mas também pela preservação dos valores da sua cultura de origem. Quer vivam no inferno de um país como a Nigéria ou num subúrbio aparentemente calmo dos Estados Unidos, elas não têm uma vida fácil. As ameaças que enfrentam podem ter origem na guerrilha ou no funcionamento de um forno microondas mas os seus dilemas contêm toda a história de um continente. (Extraído do site da Fnac.pt)
Gosto especialmente do penúltimo conto intitulado Casamenteiros, que conta a história de Chinaza, tornada Agatha quando decide casar-se com um homem nigeriano já vivendo nos Estados Unidos, que o tempo todo tenta ensinar-lhe os modos americanos e como deve esquecer da maior parte das coisas que deixou na Nigéria. Essa angústia de Chinaza é legítima e traduz o que a maioria das pessoas que saem de seus lugares sentem quando vão para longe. Muito embora essa angústia também apareça em outros contos e justamente naquele que dá nome ao livro, nesse conto, para mim, Chimamanda consegue ser mais honesta com relação aos sentimentos que, vá saber, eu também tenha sentido algum dia na vida.
O inverno apanhou-me de surpresa. Numa manhã, saí do prédio e fiquei sem fôlego. Era como se Deus estivesse a rasgar lenços de papel brancos  e a atirá-los cá para baixo.

Esse jeito de escrever me faz ter vontade de que o conto nunca acabe, assim vou lendo aos pedacinhos, mas com vontade de saber o que tem na outra página. Sofro, mas é um sofrimento gostoso, como quando a gente aperta o dedo com aquele corte de dois dias atrás.
Se eu pudesse, teria lido o livro começando por esse conto, e depois passaria ao antes desse, chamado O Estremecimento, que conta a história de Ukamaka, sua separação com o namorado nigeriano que conheceu nos Estados Unidos quando estava a fazer o doutorado e sua relação de amizade com Chinedu, este também nigeriano.
Ele disse-lhe que se chamava padre Patrick e que a vida não fazia sentido, mas que todos tínhamos de ter fé, mesmo assim. Ter fé. "Ter fé" era como ser alta e bem-feita. Ela gostaria de ser alta e bem feita, mas é claro que não era: era baixa e não tinha rabo e aquela parte mole da sua barriga teimava em parecer um pneu de gordura, mesmo quando ela usava a cinta Spanx, com o seu material elástico que apertava. Quando ela disse isso, o padre Patrick riu-se. 
- "Tenha fé" não é realmente como dizer "seja alta e bem feita". É mais como dizer: aceite que tem o pneu de gordura e que tem que usar a cinta Spanx - disse ele. 

                                                                                                     Chimamanda Adichie

Mas, de qualquer modo, há alguma coisa em Chimamanda que me faz gostar menos dela e mais de Pauline Chiziane. Talvez tenha a ver com o lugar de onde ela fala, talvez eu prefire ouvir outras histórias e não apenas aquelas de mulheres que foram embora (ou tentaram ir) da Nigéria.

quinta-feira, abril 02, 2015

V Congresso Baiano de Pesquisadores Negros/ Encontro Estadual de Educação das Relações Étnicas & afins.



Prezad@s,

Informo que o site dos eventos: V CBPN - Congresso Baiano de Pesquisadores Negros - IV Encontro Estadual de Educação das Relações Étnica, XI Semana de Educação da Pertença Afro-Brasileira e II Seminário do Mestrado em Relações Étnicas e Contemporaneidade, já está devidamente atualizado e as inscrições já podem ser realizadas.

No menu inscrições do site há o link que direciona para o formulário de inscrições virtuais.

Os links do site e das inscrições seguem abaixo:

Site: http://www.uesb.br/eventos/cbpn/index.php

Inscrições: http://webeventus.uesb.br/inscricao/inscricoes.jsp?AKJG00C04F8D8EF9=DQWGZLfsjRZskdFHNaUSX334

Cássia Eller.


14 estações de Maria.


A cor do trabalho.