Você que me lê, me ajuda a nascer.

quarta-feira, novembro 14, 2018

Tudo bem.

Eu estou bem. Você que me procura para saber, eu estou bem. Com saúde, disposição, coragem, falta o que. Às vezes quando vou sair de casa mainha me pergunta "quer o que?", eu respondo, "coragem", ela quase sempre diz que isso eu tenho demais. Então estou bem.

Estou bem, porque ainda acredito. Respiro fundo, quando não consigo acreditar ou quando me irrito. Não me deixo ficar assim por muito, mas quando acontece, penso: "vai passar,  isso tudo é uma grande besteira, daqui a pouco eu nem vou me lembrar mais dessa porcaria", aí respiro fundo, como aprendi na yoga, e continuo.

Estou bem, porque tenho companhia para estar. De homens, mulheres e crianças. De várias cores, formas e orientações. Nem com todas faço tudo mas gosto dessa situação de não ter controle do que que vai ser. Tenho aprendido a me divertir com a dúvida e a angústia, com o meu erro. Contei para um amigo que não sofro quando erro, porque me digo "tudo bem, Míghian, você é humana, não pode controlar tudo". E quando acho que outra pessoa erra, eu digo "tudo bem, Míghian, ela é humana, ela não pode controlar tudo". E assim tenho justificativas ótimas para continuar não levando a vida a sério.

Algumas pessoas que me conhecem dizem que eu levo a vida a sério demais, sim. Que eu invento isso para enganar gente. Uma outra dizia, quando eu respondia que não fazia nada da vida, que eu tinha dois empregos e fazia doutorado, mas que eu sempre respondia assim para desconcertar as pessoas, que esperavam esfregamento de título e de tempo preenchido. Pode ser verdade, sim. Mas eu não sei. O que eu quero dizer é, quando sinto que posso emaluquecer com as coisas da vida, eu penso nas coisas boas que eu tenho, aí dá uma coceira gostosa no coração e eu sorrio, aí rápido esqueço aquilo que não presta. Serve também conversar com alguém que te diz "isso vai passar", porque vai mesmo. Quando eu ouço isso, parece que destrava um monte de troço aqui dentro e eu lembro que a vida é mais que aquela irritação que apareceu ali, chata, que eu posso ir à praia agora mesmo e chegar lá em 15 minutos, então... isso de poder, de poder, de escolher algumas coisas enquanto muita gente hoje, agora mesmo, não é LIVRE, me faz ficar tudo bem. 

Eu acho que estou bem então porque na maioria do tempo eu estou tentando aprender jeitos novos de escapar das coisas que não prestam. Eu vivo nessa astúcia de descobrir caminhos que façam as coisas serem menos pesadas, mesmo que eles sejam mais longos e nada práticos. Eu faço isso, eu tenho essa consciência da minha vida em prol de ficar em paz. 

38 anos aqui e eu preciso dar um jeito de continuar o combinado de não morrer. Não é morrer só morte matada, morrida (que também é matada, às vezes), é morrer para a beleza das coisas que tem vida, sorriso, criança, música, amizade, cachorro (eu até queria um), comida, sei lá, pencas de coisas tão boas que a vida tem todos os dias. Parece que dizer isso cada vez mais soa piegas, bobo, infantil. Mas é isso aí mesmo que eu pretendo ser, voltar ao meu estado natural de quando eu nasci. Parece ingenuidade supor boa convivência no trabalho, lugar de competição intensa e desenfreada. Parece mas eu nem ligo pro que parece, eu preciso continuar assim mesma. 

O que eu aprendi com as crianças, eu não abro mão. 

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