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sábado, setembro 10, 2011

Nairobi Aguiar – De vitima a réu.



Desdobramentos nefastos do caso de agressão a estudante Nairobi Aguiar na Unijorge 


Através desta nota informamos sobre o desdobramento do caso de agressão sofrida pela nossa irmã Nairobi Aguiar nos corredores do Centro Universitário Jorge Amado e, ao mesmo tempo, conclamamos as demais irmãs e irmãos para que se coloquem diante do que está posto, não apenas para a referida irmã, mas para todas as mulheres negras desta cidade que não se silenciam diante de experiências de agressão.
Como foi amplamente denunciado, Nairobi Aguiar, estudante concluinte do curso de História na referida instituição privada de ensino, foi agredida com  um tapa no rosto pelo seu colega de classe, o estudante Lucas Pimenta, que foi delegado pela então coordenadora do curso de História da Unijorge, como membro da comissão organizadora do Simpósio de História evento que serviu de cenário para este episódio tão repugnante de racismo e sexismo. Agora Nairobi se encontra imersa numa batalha judicial que inverteu a qualificação dos envolvidos no caso; de vítima, Nairobi agora passou a ser considerada réu.
Logo após a agressão no dia 27 de Maio, Nairobi redigiu através de próprio punho uma carta em qual informava a referida instituição sobre o acontecido e solicitava dados do agressor para instruir devidamente a ocorrência em delegacia especializada. No dia seguinte, a estudante se dirigiu a Delegacia das Mulheres – DEAM logo pela manhã, à fim de registrar a ocorrência, porém o escrivão se negou a fazê-lo alegando que  aquela delegacia só registraria se a mesma possuísse algum tipo de vinculo  afetivo com o agressor. Movida por suas convicções ideológicas, a estudante acionou o movimento social de qual é oriunda no entendimento de que nenhuma agressão à mulher negra deve ficar impune – o que fez com que interrompêssemos o andamento da última atividade do evento em qual aconteceu a agressão. A ação politica realizada no dia posterior a agressão e a comunicação que a agredida fez em próprio punho culminou em um processo de apreciação administrativa do fato denunciado. Tal procedimento supostamente respaldado nos marcos normativos que orientam a estrutura estatutária desta instituição, baseado no postulado do “direito ao contraditório” desdobrou-se numa sindicância que apuraria “imparcialmente” o caso.
Para a sua surpresa, ao tentar registrar a ocorrência, Nairobi verificou que, segundo o escrivão de plantão que a atendeu na 10° circunscrição policial em Pau da Lima, ainda na noite da agressão, o senhor Lucas Pimenta tentou registrar uma ocorrência de agressão contra a estudante. Após escutar Lucas Pimenta, o escrivão o entendeu como agressor e se negou a fazer o procedimento. Nairobi registrou nesta circunscrição policial a ocorrência. No entanto a guia de exame de corpo delito não foi expedida com o argumento de  que a agredida não possuía marcas aparentes em seu rosto.
Em reunião com Nairobi, seu advogado, Dr Sérgio São Bernardo, alguns estudantes, representantes do Centro Acadêmico de História e do Movimento negro, a Senhora reitora Paloma Modesto assegurou que em no máximo 15 dias estaria com o resultado da referida sindicância e que não haveria nenhum prejuízo acadêmico caso a agredida não tivesse condições de assistir aula. A universidade propôs ainda como forma de compensação, um tratamento psicológico disponibilizado pela UNIJORGE, além de se comprometer com a  realização de um seminário sobre relações raciais e de gênero no espaço daquela instituição. Cobramos da Universidade a gravação do acontecimento, uma vez que havia câmeras posicionadas exatamente no local em qual aconteceu o fato, mas representantes da instituição alegaram que ainda não haviam assistido a gravação.
Seguindo a sua orientação jurídica, Nairobi esperou o parecer da sindicância para demandar processo civil contra o agressor já que investigação administrativa verificaria mediante apreciação das imagens do circuito interno de segurança o momento exato da agressão que ocorreu nas dependências da Universidade. No entanto, neste interim, Nairobi acionou o Ministério Público - através do grupo de atuação especial em defesa da mulher  e firmou uma declaração na qual a senhora Promotora de Justiça Márcia Regina Ribeiro Teixeira solicita à UNIJORGE e a 10ª Delegacia as imagens gravadas no corredor no horário do acontecimento. No dia 11 de junho, a Unijorge encaminhou para o Ministério Público do Estado da Bahia um esclarecimento sobre o processo de sindicância, alegando que este ainda estava em andamento e dizendo que as provas só seriam disponibilizadas em caso de determinação judicial.
No dia 27 de junho, 02 meses depois do ocorrido, foi encaminhada a UNIJORGE uma solicitação do resultado da sindicância por escrito, uma vez que as testemunhas já haviam se pronunciado a mais de um mês e o prazo estabelecido pelo estatuto já havia sido extrapolado; No dia 21 de Julho, quase três meses depois do acontecimento, a UNIJORGE, disponibiliza o resultado da sindicância dizendo não haver provas suficientes para dar como procedente a acusação contra Lucas Pimenta. No mesmo dia foi acionado um processo contra Nairobi no 1° Juizado Cível de causas comuns, utilizando inclusive o próprio resultado da sindicância como um dos documentos em anexo.  O caráter tendencioso da posição da Universidade em favor do agressor foi revelado no fato do resultado da sindicância ter alegado que a universidade não possuía as imagens e do documento ter sido informado à Nairobi apenas no dia 25, três dias após o conhecimento do agressor e a abertura do processo civil por ele acionado.
Agora Nairobi tem ameaçado o término de sua graduação em sua fase conclusiva. Sob forte pressão psicológica foi obrigada pela universidade a viver o constrangimento de dividir a sala com um homem que a agrediu física e moralmente.  A apresentação de seu trabalho de conclusão de curso no final do semestre corrente está completamente comprometida, já que seu rendimento acadêmico e a própria produção de sua monografia está sendo inviabilizada por esta situação que por ora lhe está trazendo inúmeros danos psicológicos. A universidade, através de um pacto velado de defesa ao agressor, esperou que se esfriasse o calor dos inúmeros protestos gerados por este fato que causou repúdio e comoção não apenas entre os movimentos negros, mas também entre outros setores da própria universidade. Do ponto de vista jurídico, entendemos que a universidade e Lucas Pimenta estão do mesmo lado e por isso o resultado da sindicância foi favorável ao agressor que por sua vez, foi empoderado pela coordenação do curso de História da referida instituição no Simpósio de História no qual aconteceu a agressão. À Nairobi recai agora o chamado “ônus da prova sem que se possa contar com estas imagens que registraram o exato momento do fato.
Próximo dia 14 de setembro acontece a audiência de instrução e julgamento do processo civil.  Cabe a nós militantes de movimentos negros manter o apoio a Nairobi numa demonstração de que o tapa dado em seu rosto representa uma agressão não apenas física contra uma mulher negra, mas um emblema de como o sexismo em intersecção com o racismo empodera os brancos para tratar nossa gente da forma que trata não apenas nas ruas favelas e instituições carcerárias onde somos maioria, mas também nos espaços estratégicos de poder em quais é rara a nossa presença.


Carla Akotirene
Articulação Nacional de Negras Jovens Feministas
Mestrado- PPG NEIM- UFBA

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