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sábado, março 05, 2011

Esquecer e lembrar.

Há coisas que eu nunca mais vou esquecer.

Tomar pepesoup e comer mocotó em pleno centro de São Paulo com um grupo de amigos, conhecidos, colegas. Tem muita pimenta então eles e elas esperam depois que eu tomo todo o caldo alguma cara feia, mas eu quero mais e quero o caldo, cheio de pimenta, elas dão uma risadinha quando sai uma lágrima do olho de tanta pimenta, mas é bom, faz bem, eu matei as saudades. Foi a moça que amarra o pano na cabeça quem fez, mas olha lá, tem mais uma e mais uma, cada uma com um pano diferente chegando e comendo, sorrindo.

Elas conversam fazendo caras e bocas e falam pra mim que eu faço cara e boca também, mas eu não vejo e aí eu penso que faço menos, mas talvez seja a mesma cara e boca do lado de lá.

Depois conversamos sobre tantas semelhanças e diferenças. Eu vou pra casa feliz.

Vamos para a saída do bloco afro Ilu Oba de Min, que também é yoruba. Os moços se espantam quando a moça do microfone chama Exu e diz que ele é dono do lugar. Eles me contam que lá as coisas não são bem assim, Exu é coisa séria.

O bloco segue fazendo uma apresentação folclórica com as divindades do candomblé. Elas vão cantando para os orixás, invocando os deuses. As letras das músicas são religiosas, mas as pessoas que estão ali parecem não se importar muito com isso. É só um carnaval alternativo. Mas me parece que o único modo de ouvir um ponto no meio da rua sem discriminação é se você faz disso folclore, exotismo, carnaval. Não sei se gosto disso. Sou uma velha rabugenta.

O moço nigeriano que conversa comigo é filho de rei na cidade onde morava em Lagos, estado da Nigéria. Seu nome diz isso, mas não foi ele quem me disse, por isso acredito. Ele fala de Ogum e da linhagem da sua família. Apesar de ser cristão, respeita o candomblé suficiente para não entender alguns modos de exploração da cultura negra. Ele chama um outro amigo meu, muçulmano, para me falar sobre candomblé, cultura e religiões.

Depois conheço/encontro Ni, também de Salvador. Fica espantado, como eu, com o número de pessoas brancas atrás de um bloco afro. Em Salvador, normalmente, quando há algum tipo de manifestação destas, seja porque o número de brancos/as é menor, seja porque há uma relação com o povo de santo quando essas músicas são cantadas, o número é sempre menor que o de pretos. E em São Paulo, cidade que logicamente tem mais pretos que em Salvador por ter mais pessoas, essa relação não acontece. Seguimos conversando sobre a perda identitária que a maioria das cidades grandes provoca nas pessoas.

Como disse, há coisas que eu nunca mais vou esquecer.

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