Você que me lê, me ajuda a nascer.
segunda-feira, maio 16, 2005
Jornal
Eu tava hoje pensando como eu queria que o pessoal que mora aqui no meu bairro lesse mais, lesse mais jornal, por que eu me sinto às vezes estranha quando abro um jornal no ônibus, olho pro cara do lado e por mais que eu coloque na página de esportes e tente entabular uma conversa sobre o time do coração dele, não tenho como conseguir uma cara mais amigável.
Bem, mas hoje eu estava lá sentada com meu jornal fechado e sentou do meu lado uma velhinha cheia de badulaques dentro daquelas sacolas de lojas de grife, e foi logo abrindo o jornal de hoje, lendo avidamente. Sorri pra ela e tentei me envolver na leitura, mostrar que também estava interessada. Aí ela comenta assim alto, meio sem jeito:
- Eu não entendo por que que jornal sempre escreve a mesma coisa por dias seguidos!
Imaginei que era comigo que ela falava e tentei esxplicar pra ela que às vezes as notícias se repetiam com dados novos, e então o jornal dava uma cobertura assim por cima de tudo que tinha sido escrito até então.
- Ah...
E continuou a ler.
Depois de um tempo, não sei bem como, começamos a conversar, acho que comentando o fato de terem duas blitz policiais no percurso que fizemos. Falamos sobre muita coisa, até que ela me disse:
- Minha patroa me dá esses jornais, são de hoje, mas ela me explicou que são notícias de ontem, e eu levo pros meus filhos lerem por que eu escutei ela dizendo uma vez pro filho que tudo que tá escrito aqui é a história de amanhã, que vai fazer parte da história. Então eu quero que meus filhos saibam disso tudo, da história, pra não passar humilhação de ser pobre e ainda burro.
Me animei a conversar sobre o assunto, e ela me disse também que eles não tinham dinheiro para ir ao cinema, mas sabiam de cor todos os filmes que estavam em cartaz, e se arriscavam até a comentar, apenas com o que tinham lido no jornal. E assim eram os shows, encontros, passeios... longe de tudo, mas perto da informação, assim me confidenciou Dona Sônia.
Ela pediu ponto e desceu. Eu fiquei ali no mesmo lugar pensando como a gente se surpreende, como a gente se supreende.
In Ascolto: Georgia On My Mind, Ray Charles.
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