Você que me lê, me ajuda a nascer.

segunda-feira, agosto 17, 2020

Adua, Igiaba Scego.


Livro lindo, capa linda. Comprei porque nunca tinha lido nada de uma pessoa que nasceu na Somália. Livro lindo, capa linda, conteúdo lindo. Desses livros que você queria ficar lendo pedacinhos todos os dias pela manhã, antes do café. 
São várias vozes a partir de várias perspectivas. Pai, filha, uma voz que fala no fundo da nossa cabeça. É Somália e Etiópia, é colonização e Itália, é deslumbre e medo. A cena em que a menina conhece o cinema é uma das coisas mais lindas que eu já li na vida. Na vida.

Com Lul por perto, eu teria sido impedida de me depilar como uma branca: "Mas se nós somalis não temos pelos, poruyqe é que você precisa se depilar?". E com certeza Lul proibiria que eu usasse cremes branqueadores, dizendo-me: "Mas você está louca? Essas coisas provocam câncer de pele! Além disso, sua mocinha burra, sua melanina é tão linda!" Também tenho certeza que Lul se oporia, como uma fera, ao alisamento dos meus cablelos. "Você fica ridícula com esses espaguetes, é absurdo, Adua" e me faria sentir quão bela é a liberdade de andar com seus cabelos enrolados na cabeça. Lul me ensinaria a ter orgulho de mim mesma. Entoaria minha árvore genealógica como um poema em decassílabos e diria: "Você nasceu dos ossos desses antepassados, não se esqueça dos ossos deles, de suas raízes". Com Lul por perto, ela me obrigaria a ligar para o meu pai. "Os pais devem ser amados" (p. 150).

Elefante, Titanic e fantasmas, nada precisa ficar de fora na literatura, ainda que ela esteja falando de nossa história, sangrenta história. 

                                                   Igiaba Scego

 

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