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sexta-feira, outubro 13, 2017

Tio Carlinhos.

Faz muito tempo que não o vejo. Hoje recebi a notícia que meu tio, casado com a irmã da minha mãe, morreu. Sim, morreu de um jeito tão doloroso que preciso parar de escrever para limpar os olhos da água que está jorrando deles aqui, no meio do dia, sem pedir licença. 
Meu tio Carlinhos. Eu não vou vê-lo mais. Eu não estou preparada para isso. Ele foi muito importante na minha vida num tempo em que passamos muitas necessidades. Eu ia sempre a sua casa para passar as férias ou algum feriado especial. Ele nunca rejeitou nossas visitas e eu lembro de sua insistência em me ensinar a andar de bicicleta. 
Um dia, ele acordou determinado a fazer isso acontecer. E em frente de casa, com uma bicicleta enorme, teve toda a paciência do mundo para passar um dia inteiro tentando fazer isso. Todas as pessoas riram; meus primos, seus filhos, passavam por mim andando em outras bicicletas e rindo, rindo. Eu estava achando engraçado, mas também me cansei e quis parar. Ele, não. Almoçamos e voltamos a tentar. 
Eu fui bem, mas tinha muito medo. Eu já era adolescente e não acreditava que poderia aprender a andar de bicicleta depois de velha. Mas ele, ele mesmo acreditou em mim. E eu nunca esqueci disso. Se eu aprendi? Tecnicamente, não. Mas entendi a mensagem. 
Se eu tenho lembranças chatas dele? Claro, todo mundo tem lembranças boas e ruins de todas as pessoas com quem convivem. Só que eu, desde lá, me apresso em não guardar o que não gostei e sou habituada a ser feliz e ver o que realmente vale a pena. Apesar disso, eu havia esquecido de algo muito importante é que ele fez por mim também, relembrando a mesma mensagem que me passou quando foi meu professor e bicicletar.
Minha mãe e minha tia, dias desses conversando, relembraram que foi ele quem me levou à prova do vestibular em 1998, quando eu tinha 18 anos e não sabia andar direito pela cidade. Eu não lembrava disso. Dessa época, eu só me lembrava do dia em que fui me inscrever e estive sozinha até às 23h30 na rua com muito medo de voltar pra casa, porque meu pai não se dignou nem a me buscar no ponto, quem dirás ficar na fila comigo. Chorei e fiquei mal por isso. Talvez esse tenha sido o motivo que fez meu tio me acompanhar no dia da prova, vai saber. Só sei que ele foi. Não lembro, mas ainda bem que eu tenho minha mãe para me lembrar dessas coisas e limpar meu coração de qualquer dor que exista aqui dentro, a dor de me sentir só numa fila para inscrição no vestibular. 
A mensagem do meu tio, nessas duas lembranças que agora ficam ainda mais comigo é "eu acredito em você". E isso às vezes é mais importante do que a gente mesmo acreditar na gente. A gente só é a gente mesmo junto de pessoas que nos amam. 
Tio Carlinhos, eu queria que você estivesse aqui agora. Eu ia te contar que ainda não aprendi a andar de bicicleta, mas está nos meus planos comprar uma no mês que vem. É curioso, porque eu tinha imaginado te encontrar ainda esse ano e fazer alguma piada com isso. 
Obrigada.  

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