Você que me lê, me ajuda a nascer.

domingo, março 01, 2015

Quatro anos.


Eu queria ter quatro anos hoje. Talvez menos, nunca mais que isso.

Ter quatro anos e morrer devagarinho, só se vive quando se é criança. O resto é mentira, lágrimas duras e contas a pagar. Morrendo devagarinho até chegar aos dezoito, época que eu ainda brincava de boneca e tinha um urso no lugar de um namorado.

Eu queria ter quatro anos e não saber que existiam verdades e mentiras. Verdades que você iria preferir não ouvir como “sua mãe já não tem a mesma coragem de antes, filha” ou “eu amo você, mas estamos longe”.
Morrendo devagarinho nas mãos daquela professora que dizia “senta direito”, “come tudo, de garfo e faca agora, “não briga com o coleguinha”, “obedece sua mãe”. Queria saber se ela ia mandar obedecer a mãe mesmo quando ela acorda num humor péssimo, como hoje.

Eu queria ter quatro anos hoje e não mais que isso daqui a um ano, quando eu escreveria essa poesia de novo e faria o tempo voltar outra vez.

Eu queria ter quatro anos, só isso. Não queria saber que iam me matar, matar a criança que eu era, queria ser de novo boba e imbecil, perdoando pessoas e emprestando lápis de cor, brigando por amigas que nem valem a pena, indo pra casa sem minhas presilhas douradas porque dei de presente para alguém.

Eu queria ter quatro anos, nem precisava ser criança prodígio ou coisa do tipo, não queria saber ler nem escrever, nomes enormes de dinossauros na ponta da língua, matemática, nada. Queria massinha de modelar e encher a boca de bala que vira chiclete, brincar de corda e bambolê na rua.


Quatro anos. 

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