Uma das moças da limpeza, eu fico conversando com ela. Não ponho o nome aqui porque ela não me autorizou, mas eu sei qual é. Entrei no banheiro e ela me contou o tanto de sujeira que fica aquilo ali toda noite, que não era possível que as pessoas precisassem fazer tanta sujeira pra usar o banheiro. Ela me pergunta:
- Você que é inteligente, me responde porque é que gente inteligente gosta de fazer sujeira.
Eu tento inventar uma resposta:
- Não é assim, não é por ser inteligente que gostam de fazer sujeira. É porque grande parte das pessoas que estudam nessa universidade tem alguém para fazer para elas, quando chegam aqui, não acham que tem que limpar o que sujam. Não é porque são inteligentes, é porque são mal-educadas e desumanas com as pessoas que limpam.
- Mas aqui não é uma faculdade de Educação? Aqui não é uma universidade, um lugar onde se aprende coisas?
- É, mas essas pessoas tem uma herança...
- Herança, são ricas, né?
- Não bem essa herança. A maioria das pessoas que vem aqui não são ricas, mas tem uma vida remediada. A herança que elas guardam mesmo é a da escravidão. Naquela época, essas pessoas tinham pessoas que faziam coisas para elas, o tempo inteiro. E, mesmo que hoje elas não tenham esse serviço, eu acho que não conseguiram se desprender dessa herança.
- É por isso que ninguém fica neste trabalho. É muito desrespeito. A chefe falou que se vir alguma coisa, alguém sujando tudo, não é pra reclamar, mas eu falo. Eu digo, se você não se importa com quem limpa, pelo menos deixa limpo pra outra pessoa que vem.
Ela continua falando, coberta de razão e eu toda sentimento (ódio, tristeza, indignação). Não sei o que dizer, não tenho mais o que dizer.
Depois, ela conclui:
- É, você me explicou bem, não é porque são inteligentes, é por causa da herança da escravidão. Mas eu não sou escrava... quer dizer, não de verdade, né? Mas para essas pessoas, elas devem me ver assim.
Não quis deixá-la triste. Mas não seria a única mulher negra triste ali, naquele banheiro.
Algumas meninas entraram, continuamos conversando. Eu fazia questão de falar BEM alto, para deixar BEM marcada minha posição. As meninas pareciam sem jeito. Eu estava um pouco eufórica. A moça disse para eu não ligar tanto, deixar pra lá. No final das contas, ela foi quem me consolou.
Não soube bem o que fazer. Me restou escrever esse post.
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