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quarta-feira, julho 18, 2007

Sobre chaves, pertencimentos, frio e morte.

Descobri, em mais uma das minhas viagens, que o meu problema com chaves é coisa de herança. Minha mãe tem problemas com chaves: vive remexendo a bolsa, assim como eu, à procura das dela sempre que estamos juntas, atravessando a rua ou comprando frutas. Meu irmão volta religiosamente todos os dias, depois de ter andado 10 passos em direção à escola para buscar a sua cópia, isso quando tem alguém em casa. Então eu sorrio, sei que essa coisa com chaves vai além de mim, e agora já não é tão ruim esquecê-las também, pelo menos eu faço parte de alguma coisa, grupos e eventos, é isso. É isso por que todo mundo adora fazer parte de alguma coisa, por mais bizarro que pareça às vezes. E escrevendo isso eu lembro que minha mãe é a única pessoa que pega na minha mão para atravessar a rua. Então eu penso, para além de qualquer desavença, para além de qualquer "onde você vai" ou "quem era no telefone?", ela pode tudo isso, por que ela pega na minha mão, cuida de mim. Indo de Salvador à Porto Alegre no espaço de um dia, saindo de um pôr do sol na Ribeira para encontrar uma segunda de quatro graus lá no finzinho do Brasil, você também se perguntaria "que que eu tou fazendo aqui?"; sigo em passos curtos, mas certos, para o encontro. Espero que mude coisas aqui dentro, que eu melhore como pessoa, que valha a pena passar dez minutos me vestindo e outros dez minutos praguejando, por que esse frio tá me gelando o coração. Escrevi dia desses, escrevi para que eu lesse, por causa de alguém que me fez ir dormir sonhando: é uma pena que você, de tão especial que era, depois de tudo, se torne mais um rapaz comum. Acho que fica mais triste ainda se eu disser que nem tive tempo de contar pra ele que ele era tão especial, me embriaguei e falei bobagens do tipo "quero alguém pra me amar", talvez eu tenha sido dura por ter falado embriagadamente séria, mas fazer o quê, agora já foi, o que fica aqui são os silêncios, telefone que não toca e a madrugada inteira esperando, não posso fazer nada, não posso voltar no tempo, e nem quero, é só uma questão dele, do tempo, amanhã vai passar, meu coração que é enorme de todo não vai gelar, não vou deixar. Pessoas morreram, neste avião que aterissou, quando todo mundo que crê em qualquer coisa já tinha agradecido por estar vivo, então foi a última prece; e mesmo eu, que não agradeço à moda cristã, digo ufa baixinho, e fico pensando, seria meu último ufa. Isso é triste, é chato e não faz você ter vontade de sair de casa. Chuva, frio e morte. Mas não é que o sul seja assim. Me parece educado, mas me parece discreto demais. Eu gosto de sorrir, olhar no olho, pegar na mão sem luva. Sinto falta do pôr do sol na Ribeira. Abro o celular, suspiro, olho a foto. Amadora, mas salvadora.

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