Você que me lê, me ajuda a nascer.

domingo, junho 28, 2015

O olho mais azul.

Toni Morrison 

Ela. Dona Toni. Uma das poucas que eu chamo de Dona. Dona porque dona das palavras e manda nos meus sentimentos. Quando a leio me leio.

O olho mais azul é seu primeiro romance e foi publicado em 1970. De lá pra cá muita água já rolou e Toni só melhorou. Nessa edição um posfácio ma-ra-vi-lho-so alimenta minha alma (e me dá mais munição pra tese). 


Ela diz

O olho mais azul foi minha tentativa de dizer alguma coisa sobre isso [sobre o fato de uma colega sua de escola querer ter o olho azul]; dizer sobre algo que ela não tinha, ou talvez nunca viesse a ter, a experiência do que possuía e também porque rezava por uma alteração tão radical. Implícita em seu desejo estava a aversão por si mesma, de origem racial. E vinte depois eu continuava me perguntando como é que se aprende isso. Quem disse a ela? Quem a fez sentir que era melhor ser uma aberração do que ser quem ela era? Quem a tinha olhado e a achado tão deficiente, um peso tão pequeno na escala da beleza? Este romance busca relances do olhar que a condenou (p; 210). 

Eu deveria ter contado sobre o livro antes de botar o que Toni disse, mas não consegui. O livro é a história de Peccola Breedlove, uma menina de doze anos com uma família com problemas de relacionamento, resumindo bem grosso modo a história toda. Porque não é bem a história que faz sentido apenas quando Toni conta é como ela conta que faz você pensar que talvez nunca tenha lido um livro tão bom. Eu deveria ter começado por este antes de ler todas as outras coisas dela. Eu a teria entendido mais e teria entendido também o próprio caminho que percorreu durante suas escritas. Mas, tudo bem. Ainda tenho mais uns 100 anos de vida para reler Toni. E não, eu não precisaria de ler mais outras pessoas se pudesse lê-la de novo.

O livro é contado por Claudia, menina negra que recebe Peccola por um tempo em sua casa, quando o pai desta - Cholly - põe fogo na casa e ela precisa de um lar para morar enquanto a família se organiza novamente. 

Curiosamente, tenho lido livros que falam de crianças a partir do ponto de vista delas mesmas ultimamente, mesmo sem buscar diretamente isso nos livros de literatura que tenho escolhido. Organizei, por isso, um roteiro literário-sentimental para a escrita de tese que, depois de pronto, publicarei aqui.

Vai um pedaço do livro?

Depois cresceram. Entraram devagar na vida pela porta dos fundos. Todo mundo podia lhes dar ordens. As mulheres brancas diziam "Faça isso". As crianças brancas diziam "Me dá aquilo". Os homens brancos diziam "Venha cá". Os homens negros diziam "Deita". As únicas pessoas de quem não precisavam receber ordens eram as crianças e as outras mulheres negras. Mas ela pegaram tudo isso e recriaram à sua própria imagem. Administravam a casa dos brancos, e sabiam disso. Quando os brancos espancavam os seus homens, elas limpavam o sangue e iam para casa receber maus-tratos da vítima. Batiam nos filhos como uma mão e com a outra roubavam para eles. As mãos que cortavam árvores também cortavam cordões umbilicais, as mãos que torciam o pescoço de galinhas e abatiam porcos também cuidavam de violetas africanas até que florissem; os braços que carregavam feixes, fardos e sacos também embalavam bebês (p. 139).

Há críticas sobre a literatura de Toni (assim como a de Walker) sobre a forma como elas representam homens negros. Mas isso é papo pra outra história e para o próximo livro...


Dona Toni

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