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terça-feira, fevereiro 25, 2014

Francisca.

Desde o ano passado, conheci Francisca. Eu sentada, almoçando no bandejão, ela me pergunta sobre meu cabelo. Diz que o filho vai fazer uma formatura do segundo grau e ela quer se arrumar, mas ele disse que não a quer de cabelo liso, de chapinha. Ele pede que ela solte a cabeleira e ela me pergunta onde eu faço minhas tranças, quer trançar também. Conversa vai, conversa vem, todos os dias falamos sobre cabelos e belezas, vaidades. Francisca é conversadeira e eu mais, as pessoas desconcertadas ao nosso redor não entendem a amizade que a gente faz, vai saber.
Com o bandejão fechado por dois meses, ficamos sem nos ver um bom período. Desde a semana passada, eu a procuro. Encontrei-a ontem, perto da catraca da saída, olhando pra fora. Beijos, abraços, mas ela está apreensiva. Procura alguém. Me diz, emocionada
meu filho passou, pra Sociais. Hoje é o primeiro dia de aula. Ele disse que viria almoçar... ele nem tem 18 anos. Eu nem sei o que eu tou sentindo direito.
Eu a abraço de novo, talvez para esconder minhas lágrimas (estou chorando agora também). Digo para ela que ela é maravilhosa, uma pessoa especial, uma mãe ótima, mas eu acho que ela nem me ouve direito. Está realmente fora do ar, meio boba com tudo que está acontecendo. Não sei se consegui sentir algo parecido com o que ela sentia, mas fiquei pensando quais eram os sentimentos que a tiravam do chão. Sempre esteve ali, naquele espaço, cozinhando para pessoas que muitas vezes nem a olhava nos olhos e agora, espera pelo filho para vê-lo entrar pela porta da frente do bandejão.
Pensei nele, em sua coragem de adolescente ao pedir para a mãe não alisar o cabelo para ir à sua festa de formatura. Ela me disse
semana passada só foi calourada, ele usa black, igual você. Mas não cortaram, não.
Tenho orgulho dele, tenho orgulho dela. Tenho orgulho de me parecer com ela, com ele. Passo a catraca chorando e sorrindo, sem vergonha de ser boba. A fila enorme de gente nova repara e devem já ter me pregado algum tipo de anomalia social, do tipo bipolar ou transtornada.
Francisca e Robson saíram nos jornais. Com todo o sensacionalismo que a notícia merece (filho da cozinheira, o nome dele é Robson). Fico feliz de ter conhecido Francisca (eu realmente não sei qual é a conexão, o que acontece, há sempre muitas meninas de cabelo crespo no bandejão, mas ela veio falar comigo, me sinto orgulhosa por isso). Mal vejo a hora de abraçar Robson. Agora, rezo para que ele continue com sua coragem de adolescente e não deixe essa universidade maluca tirar-lhe essa coragem e esse juízo.
Eu sou mais Robson.

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