Sei que parece estranho um post com o título "Em memória de uma gata" estampar a foto de Namaste. A gatinha que eu tive morreu três meses depois que aqui chegou. Enterramo-la no quintal, se é que posso escrever no plural: quem enterrou a gata foi um amigo, eu só chorava. Eu escolhi esse título por conta do texto de Roberto Kaz, escrito na revista Piauí de dezembro de 2024. Li e pensei: finalmente, alguém conseguiu escrever sobre a relação entre um humano e um animal sem aquela pieguice cafona e imbecil que as pessoas que acham que são "mãe e pai de pet" têm. Finalmente.
Reproduzo aqui um dos trechos que mais gostei:
[...] Gatos e cachorros não são filhos, ainda que muita gente goste de chamá-los assim. Um filho deve sobreviver a você. Um bicho, não. O ponto de partida da relação com um bicho é a consciência da finitude: você envelhecerá alguns anos, enquanto ele irá de filhote a idoso. O fim está contratado. É bonito que a natureza nos dê o privilégio de acompanhar esse ciclo. E é mais bonito que esse ciclo possa ser acompanhado pela lente do amor.” Eu explicava, em seguida, que apesar de não ser meu filho, Aderbal era minha família: “E meu protetor. Isso é uma certeza que carrego: meus bichos são meus orixás, sempre regulando a energia que me cerca.” [...] Aderbal foi um gato de alma grande, como definiu a Patrícia, sua médica de família. E foi um miliciano, como também definiu a Patrícia. Apesar de obeso e castrado, tocava o terror nas casas da vizinhança. Pulava muros de 2 metros, passava a madrugada fora, voltava às quatro da manhã com a cara estropiada. Isso até o dia em que foi atropelado. Perdeu dentes e a visão de um dos olhos, mas não a gigantesca afetuosidade. Era tão expressivo e grosseiro quanto generoso. Hoje, quando choro, não é pelo vazio. É pela dor da perda (o fim é difícil) e sobretudo pelo reconhecimento da dádiva que foi passar dezoito anos ao lado desse bicho
Namaste já morava aqui quando ela se foi e foi o último a brincar com ela. Não sei se sentiu falta, mas a verdade é que brincavam muito os dois. Escolhi pôr uma foto dele e não dela porque eu quis. Não tem explicação. Mas esse texto, de verdade, é em memória de uma gato, Titilayo.
Tenho poucas lembranças dela e nem de longe conseguiria, com o tempo que tenho agora, escrever com tanta beleza como Kaz fez (ainda bem que existem os escritores no mundo, ainda que não sirvam para nada). De todo modo, ler o texto dele, lembrar dela e postar esse texto aqui já me faz feliz demais. Nessa ordem.
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