Ela entrou na van e eu olhei para ela, olhar cansado.
Passava das sete da noite, era noite. Estava escuro. Ela entrou, não há passagem para circular, a van muito apertada e ela para ali, na frente.
Oferece o quebra-queixo. Para, espera que alguém compre. Não parece ter pressa.
E, nesse momento, entre o momento em que ela ofereceu o quebra-queixo pela primeira vez e até quando o primeiro moço que estava na cadeira de uma das primeiras fileiras da van levantou a mão e disse quero um, meu coração foi tomado de amor por ela, um amor miúdo, mas satisfeito, amor.
Eu não sei o motivo, eu não entendo quando e porque isso acontece, só sei que acontece e meus olhos enchem de água assim, uma aguinha pouca, mas presente. Um sorriso me confunde os sentidos, eu estendo a mão, um pouco hipnotizada, quero um, eu disse. Comprei, ela procura o troco na sua pochete com moedas, me entrega. Repete o oferecimento, mais gentes compram, ela pede que alguém da van lhe troque vinte reais para que possa vender mais um, não sei o que acontece ela passou por mim, está atrás de mim, não vejo. Fico feliz por ela vender alguns quebra-queixos, fico feliz por entender sua pausa e sua espera, sua calma. É muito rápido, mas tudo naquela van parece acontecer muito devagar, como o rosto dela parado, esperando compradores, pensativa, na frente da van.
Vê-la ali tão jovem, tão linda, tão pano na cabeça sem ser fashion, tão absorta em seus pensamentos enquanto esperava, tão doce, tão negra, tão mulher, tão do interior, tão... me deu tanta gana de continuar a viver que eu nem consigo terminar esse texto.